Periscópio “O País da Impunidade” por Antonio Luiz

2008-07-18 12:13:00

O País da Impunidade

Há alguns anos, aconteceu em São Paulo um caso policial que teve certa repercussão por sua desproporcionalidade. Uma moça havia roubado um pote de manteiga num supermercado. Muito pobre e desempregada, a moça entrou em desespero ao ver o filhinho passando fome e como último recurso se viu obrigada a cometer o delito. Pegou mais de dois anos de cadeia. Quando seu caso veio a público, houve uma avalanche de gente suplicando pela libertação da jovem, reconhecidamente uma pessoa de bem que num gesto extremo havia cometido algo ilegal, mas que  certamente não era passível de um castigo tão rigoroso. Pois bem, quando esperava-se que juiz que a sentenciou ouvisse o clamor público, este simplesmente manteve a pena sem clemência. A jovem ficou presa mais alguns meses e somente foi libertada quando cumpriu o tempo determinado para sua condicional. Afinal, ela era uma pobre coitada, sem ter onde cair morta e, por isso mesmo, sem grana para pagar um advogado. Ela não teve um presidente do Supremo Tribunal Federal para condoer-se da sua situação.

Os dois Hábeas Corpus concedido pelo ministro Gilmar Mendes para o escroque Daniel Dantas foi um acinte à sociedade brasileira e causou uma onda de indignação em vários setores, inclusive nos próprios juizes que condenaram a atitude do magistrado, chegando mesmo a colocar em dúvida sua honestidade achando que ele poderia estar comprado como indica uma das gravações em que o preposto do banqueiro marginal diz que “o problema de Dantas é na primeira instância, já que no STF ele tem trânsito fácil”.

Ta bem! Vamos admitir que a, como diz o ministro Gilmar, espetacularização da Polícia Federal tenha sido exagerada e que o distinto público que paga impostos para encher as burras do governo e esse bando de salafrários roubar, não tenha o direito de ver os marginais algemados como um reles ladrão de galinhas. Mesmo assim, condoído com as humilhações infligidas aos detidos por policiais desalmados, Mendes soltou Dantas e onze quadrilheiros. Amparado em provas colhidas na véspera, o juiz federal Fausto De Sanctis decretou novamente a prisão preventiva do banqueiro. O presidente do STF tornou a tirá-lo da cadeia. Na sexta-feira, Dantas e toda a turma estavam na rua, liberados para subornar delegados, parlamentares ou figurões federais, mobilizar estafetas bacharelados do PT e seduzir juízes ou ministros togados.Mais uma vez fizemos o papel de otários numa história que parece não acaba nunca.

Daniel Dantas e Naji Nahas são velhos meliantes. Sobejamente conhecidos da Justiça brasileira. Mas, sempre conseguem escapar, já a moça do pote de manteiga ficou meses na cadeia. Dantas comprou até o filho do presidente da República e até agora ninguém se dignou a fazer uma investigação séria a esse respeito. O governo Justiça trouxeram de volta para o Brasil o estelionatário Salvatore Cacciola que estava preso em Mônaco. Será mais uma boca para o contribuinte alimentar, além de não fazer a menor diferença onde ele vai cumprir sua pena. Enquanto isso, os marginais locais flanam pelos escaninhos do poder impunemente e à vontade para cometer seus crimes.

A decisão do senhor ministro Gilmar Mendes desagradou todos os cidadão dignos desse país, mobilizou dezenas de instituições que se alinharam em favor do juiz federal Fausto DeSanctis, aquele da primeira instância que decretou as prisões de desmoralizou um dos poderes da Nação ao fazer dele um instrumento para vaidades e joguinhos de intrigas. Resumo da Ópera: Por meio de entidades que abrigam a categoria, os delegados lançaram o Manifesto à Nação, documento que acusa o ministro de colocar em risco “a estabilidade da ordem legal”. “Repudiamos cabalmente as declarações do ministro”, disse o presidente do Sindicato dos Delegados da Polícia Federal em São Paulo. “Nosso objetivo é dar apoio total e irrestrito aos delegados responsáveis pela operação. Está muito claro que pretendem desprestigiar essa equipe que fez uma investigação exemplar. Não houve abuso nenhum.”

Os federais censuram “a forma ilegal, arbitrária e indigna com que o ministro atingiu a independência e a dignidade de toda magistratura do País, lançando dúvidas sobre a lisura de suas decisões, inclusive sob ameaça de investigação pelo Conselho Nacional de Justiça”.

Tivessem mantido Dantas em cana e talvez ele abrisse o bico para contar suas exdruxulas relações com o governo petista, a começar pelo mensalão, já que ele havia dito “vou detonar, contar tudo”. Pena que o país tenha perdido essa chance.