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quinta-feira, 28 de março de 2024

O lugar com a maior contaminação nuclear dos EUA

2018-02-06 23:01:00

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Image captionDesativada há quase 50 anos, a usina de Hanford continua cercada por avisos de segurança

Para alguns, é preciso estar louco para querer morar ali. Para outros, trata-se do lugar dos sonhos, onde qualquer um pode prosperar.

De qualquer modo, não é fácil ter como vizinho o local de descarte de resíduos nucleares que concentra a maior contaminação em todos os EUA: a usina de Hanford, no sul do Estado de Washington. Desativado em 1987 após 44 anos em operação, o local passa desde então por um longo e complexo processo de limpeza.

"Nasci em Richland em 1955 e aqui fui criado", diz à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC. Bob Thompson, prefeito dessa cidade que, ao lado de Kennewick e Pasco, se destaca por sua proximidade com a antiga usina nuclear.

A região depende do dinheiro destinado à limpeza da usina, admite Thompson, para quem há um forte estigma associado à vida no local.

"Isso não vem de nós, moradores, mas sim das pessoas de fora. É por isso que estamos tendo esta conversa, não? Por causa do estigma", diz.

Segundo ele, é exagerada a atenção dada a qualquer incidente ocorrido em Hanford.

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Image caption'Onde a segurança vem em primeiro lugar', diz a placa de boas vindas às instalações de Hanford

"Os esforços cotidianos de limpeza não despertam interesse, mas qualquer vazamento ou acidente, sim", afirma.

Alta contaminação

A assessoria de imprensa de Hanford Site enviou à BBC informações sobre o processo de limpeza nuclear, tido como um dos maiores do mundo – e que ainda levará décadas para ser concluído.

Em 1989, o Departamento de Energia dos EUA e o Departamento de Ecologia de Washington firmaram um acordo para tratar as instalações.

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Image captionDesde sua criação, há quase 75 anos, houve uma série de incidentes na usina nuclear | Foto: Hanford Site/Divulgação
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Image captionOs trabalhos de limpeza começaram em 1989 | Foto: Hanford Site/Divulgação
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Image captionEstima-se que esse processo possa demorar pelo menos mais 50 anos | Foto: Hanford Site/Divulgação

Durante as quatro décadas de atividade em Hanford, foram geradas milhões de toneladas de resíduos sólidos e centenas de bilhões de litros de dejetos.

A planta, que se estende por uma ampla planície próxima ao rio Colúmbia, é um complexo nuclear operado pelo governo dos EUA. O início das operações foi em 1943, com um objetivo claro: produzir plutônio para a fabricação de armas nucleares.

"Apesar do progresso feito, ainda resta muita contaminação", diz o comunicado de Hanford. "O processo para produzir plutônio é extremamente ineficaz: gera uma grande quantidade de resíduos sólidos e líquidos, mas só se obtém uma pequena quantidade de plutônio."

Ali se desenvolveu parte do Projeto Manhattan, que culminou com a elaboração das bombas atômicas que terminariam sendo famosas pela destruição de Hiroshima e Nagasaki, em 1945, episódio que marcou o fim da Segunda Guerra Mundial.

Para o prefeito de Richland, o lançamento das bombas foram um evento "trágico, mas necessário" para pôr fim à guerra – a outra opção, uma vitória de Hitler ou do Japão, teria sido muito pior, diz.

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Image captionO local onde funcionava a usina, hoje chamado de Hanford Site, ocupa uma grande área em uma planície no Estado de Washington | Foto: Hanford Site/Divulgação

Um lugar cheio de vida

Ainda que tenha se transformado em um lugar onde ocorre uma espécie de "destruição profissional" – por causa do processo de limpeza da usina -, Hanford era um local cheio de vida no período logo após o fim da Segunda Guerra.

Em seu livro Plutopia: Nuclear Families, Atomic Cities, and the Great Soviet and American Plutonium Disasters ("Plutopia: famílias nucleares, cidades atômicas e os grandes desastres soviético e americano de plutônio", em tradução livre), lançado em 2013, a historiadora americana Kate Brown descreve Richland como uma das primeiras "comunidades nucleares".

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Image captionA usina já foi a principal empregadora da cidade | Foto: Hanford Site/Divulgação

"Trabalhar em Hanford, mesmo quando muitos não sabiam a dimensão real do que estava sendo produzido ali, era considerado um ato patriótico", diz Brown à reportagem.

Em sua obra, a historiadora compara a planta de Hanford à de Ozersk, na antiga União Soviética.

Ela relata que os diretores de ambas as instalações perceberam que o melhor seria construir o que a autora chama de "plutopia": a ideia de que entrar naquela comunidade de residentes era como "ganhar na loteria".

"Richland se constituiu como uma cidade subsidiada pelo governo federal, onde os salários eram 30% mais altos que a média, com excelentes escolas e importantes auxílios à moradia", conta Brown.

"Até os anos 60, todas as minorias foram excluídas de Richland. Os negros e os latinos que trabalhavam na usina eram forçados a viver do outro lado do rio."

Sem risco de explosão

O prefeito não tem muitas queixas nem más recordações associadas a Hanford.

Thompson conta que saiu de sua cidade natal por alguns anos, mas que voltou para abrir um escritório de advocacia para atender as chamadas Tri-Cities – Richland, Kennewick e Pasco.

"As pessoas me olhavam como se eu estivesse louco. 'Como você vai voltar a viver lá!', me diziam."

"Quem era de fora pensava que havia risco de explosão – e não é assim. É complicado produzir a carga, o plutônio – é só ver a dificuldade que estão tendo países como Irã e Coreia do Norte", defende.

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Image captionAlém de Richland, as cidades de Kennewick e Pasco também estão próximas da área de usina | Foto: Hanford Site/Divulgação

O prefeito diz que não chegou a ser impactado pela proximidade da usina, ainda ativa durante sua infância e juventude.

"Era a época da Guerra da Coreia e da crise dos mísseis com Cuba", diz. "Nós encarávamos de forma séria as ameaças, tínhamos que nos proteger diante da Rússia e da China."

O prefeito lembra que a cidade estava mais preocupada com a possibilidade de ser atingida por uma bomba ou um míssil do que pelos eventuais perigos que a usina representava.

"Não significa que ela não seja perigosa e que a limpeza não seja necessária", ressalta. "Nos anos 40 e 50, já estávamos acostumados. Quando alguma coisa está sempre aí, ela se torna habitual."

Contaminação da água

Mas para os ativistas da Hanford Challenge, uma organização da sociedade civil, a vida em Richland e nas cidades vizinhas implica sérios perigos, especialmente por causa da água.

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Image captionAtivistas afirmam que querem proteger também a natureza do sul do Estado de Washington | Foto: Hanford Site/Divulgação

Os vazamentos de resíduos nucleares líquidos se infiltram no lençol freático que, por ser relativamente superficial, é facilmente contaminado.

Assim, diante do temor de que a contaminação atinja o rio Columbia, o Hanford Challenge monitora de forma contínua os trabalhos de limpeza realizados no local.

"Por sermos independentes e não termos restrições, podemos atuar como uma organização vigilante", diz Tom Carpenter, diretor da entidade.

"Queremos deixar um legado ambiental que seja sustentável para as três cidades e para mais além", acrescenta ele, que não se mostra muito otimista em relação ao processo de limpeza.

"Já estouraram o orçamento e estão bastante atrasados com o cronograma."

Vazamento nos tanques

A maior parte dos resíduos nucleares de Hanford estão acondicionados em grandes tanques, à espera do momento em que possam ser transportados para outro lugar.

O destino final ainda não está claro. Fala-se na possibilidade de distribuir os resíduos entre os Estados de Novo México e Texas, mas por ora não há nenhum lugar para onde possam ser levados.

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Image captionJá se cogitou levar os dejetos para os Estados do Novo México e Texas | Foto: Hanford Site/Divulgação

O problema é que alguns dos tanques têm apresentado pequenos vazamentos.

Datados nos anos 40 e 50, os recipientes originais já liberaram para o solo pelo menos 3,5 milhões de litros de dejetos líquidos.

Hanford chegou a construir tanques com dupla proteção nos anos 70 e 80 e começou a transferir para eles os resíduos radioativos.

Em outubro de 2012, contudo, o Departamento de Energia informou que um dos novos tanques tinha um vazamento entre as duas camadas de proteção.

Ainda que a dispersão do líquido pareça controlada, existe ainda a preocupação de que outros recipientes eventualmente apresentem a mesma problema.

O prefeito de Richland, porém, se diz tranquilo.

"Os responsáveis pela segurança de Hanford têm muita competência. Confio plenamente neles. São pessoas que quero que estejam aqui caso aconteça algum problema."

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